O poder das histórias no desenvolvimento cognitivo - da infância à maturidade
- Maristela de Souza
- 1 de jan. de 2023
- 2 min de leitura
O cérebro das crianças está em constante transformação. Desde os primeiros anos de vida, ele é moldado pelas experiências e estímulos do ambiente em que a criança está inserida (Hackman, Farah & Meaney, 2010; De Souza et al., 2021). As práticas parentais — como o brincar, o diálogo e as atividades compartilhadas — são essenciais nesse processo, pois favorecem a maturação cerebral e cognitiva (Britto et al., 2016).
Um dos conceitos mais interessantes nesse contexto é o de reserva cognitiva, que ajuda a explicar por que algumas pessoas mantêm suas habilidades cognitivas mesmo diante de fatores de risco, como o envelhecimento ou doenças neurológicas. Essa reserva é construída ao longo da vida, a partir de estímulos intelectuais, educacionais e sociais (Cotrena et al., 2016). E tudo começa na infância, quando o vínculo parental estabelece as primeiras bases para o aprendizado e o desenvolvimento emocional (Diamond, 2013; Branco, 2014; Dias, 2020).
Pesquisas apontam que hábitos de leitura e escrita têm impacto direto na cognição e podem ser até mais representativos do que os anos formais de escolaridade (Cotrena et al., 2016; Pawlowski et al., 2012). No Brasil, o Programa “Conta pra Mim”, criado pelo Ministério da Educação, incentiva a literacia familiar — o conjunto de práticas que envolvem a leitura e a contação de histórias entre pais e filhos (Brasil, 2019). Esse tipo de estímulo, conhecido como Home Literacy Environment, promove o contato com livros e histórias dentro de casa, fortalecendo as bases da linguagem e do pensamento (Alston-Abel & Berninger, 2018).
Diversos estudos mostram que a leitura compartilhada melhora o vocabulário, a coerência textual e até as funções executivas, além de favorecer a socialização e o vínculo afetivo (Zuanetti, Novaes & Fukuda, 2021; Sari et al., 2019). Essa prática também tem se mostrado eficaz como estratégia terapêutica, inclusive em crianças com Transtorno do Espectro Autista (Zuanetti, Novaes & Fukuda, 2019).
Mas o poder das histórias não se limita à infância. Os idosos, por exemplo, são grandes contadores de histórias — e essa atividade contribui para manter a mente ativa, as emoções equilibradas e as conexões sociais vivas (Pecorini & Dupláa, 2017; Pereira et al., 2019). A contação de histórias ativa áreas cerebrais ligadas à memória, linguagem e emoção, fortalecendo o bem-estar e a reserva cognitiva (Livingston et al., 2020; Barber & Mather, 2014).
Assim, quando um avô narra uma história a uma criança, algo poderoso acontece: duas gerações se beneficiam cognitivamente. Enquanto a criança expande sua imaginação e linguagem, o idoso reforça suas memórias e funções mentais, num verdadeiro exercício de conexão e vitalidade (Wright et al., 2011).


Converso muito com meu avô sobre histórias da vida dele.